quarta-feira, 29 de abril de 2015

Vídeo onboard da Tobatta tailandesa preparada para arrancadas

Aquele microtrator Kubota semelhante ao modelo que foi comercializado no Brasil pelo mesmo fabricante usando a marca Tobatta, apareceu não apenas naquele vídeo em que vence uma Mitsubishi L200 Triton extensamente modificada, mas também num vídeo onboard que dá uma idéia de como deve ser domar os 65cv de fúria do motor de aproximadamente 1.2L e apenas 1 cilindro.
Apesar de ter algumas semelhanças com o Brasil por ter se tratado de uma colônia de exploração, a Tailândia acabou desenvolvendo uma cultura automobilística diferenciada e bem mais receptiva aos motores Diesel também em aplicações recreacionais e esportivas. A disponibilidade mais imediata de combustíveis pesados como o óleo diesel e o querosene no sudeste asiático durante o pós-guerra, e a gasolina sendo pesadamente tributada como um artigo de luxo, levaram a uma ampla aceitação dos motores Diesel de um modo geral, embora atualmente venham enfrentando a concorrência do gás natural em aplicações veiculares leves. A proximidade geográfica com o Japão, que já apostava no Diesel para fins militares no período entre-guerras e depois em utilitários comerciais, também exerceu alguma influência sobre o mercado automobilístico tailandês.

terça-feira, 28 de abril de 2015

Audi: apostando num óleo diesel sintetizado a partir de água e dióxido de carbono

Foi anunciado pela assessoria de imprensa da Audi, no dia 21 desse mês, que a empresa teria desenvolvido um novo tipo de combustível, para ser usado em substituição ao óleo diesel convencional. Baseado no princípio do "sequestro de carbono" através de um método desenvolvido pela empresa suíça Climeworks, o combustível denominado provisoriamente de "e-diesel" tem como matérias-primas água e dióxido de carbono (CO², também mencionado frequentemente como "gás carbônico"), e toda a energia elétrica necessária ao processo de produção é obtida de fontes "renováveis" como a eólica, a fotovoltaica e a hidro-elétrica. O processo ocorre com a vaporização da água a cerca de 800º C, seguida de uma eletrólise do vapor d'água para que o hidrogênio reaja com o dióxido de carbono, também a altas temperaturas e pressões, e atinge uma eficiência de 70% na conversão das matérias-primas ao óleo-base, que pode ser consumido puro ou misturado ao óleo diesel convencional. Além de ser isento de enxofre e hidrocarbonetos aromáticos, apresenta um índice de cetano superior que garante uma combustão mais completa e com menos resíduos, mais notadamente o material particulado (fuligem em suspensão na fumaça preta visível). A ministra da Educação alemã, Johanna Wanka, já participa de testes com o combustível, aplicado ao Audi A8 3.0TDI CleanDiesel quattro que a serve como viatura oficial. Uma fábrica experimental em Dresden já produz cerca de 160 litros de "e-diesel" por dia, mas há estimativas de que o preço final ao consumidor quando for atingida a escala comercial fique numa faixa entre 1 e 1,50 euro por litro, competitivo diante dos atuais preços do óleo diesel convencional na Alemanha.

sábado, 18 de abril de 2015

Uma reflexão sobre as normas MAR-I

De acordo com a Resolução CONAMA 433/2011, editada em 13 de julho de 2011 e publicada no Diário Oficial da União no dia subsequente, máquinas agrícolas e outros equipamentos autopropulsados para aplicações fora-de-estrada novos passariam a ter as emissões de poluentes e ruídos regulamentadas a partir de 1º de janeiro de 2015 de acordo com Instrução Normativa a ser publicada pelo IBAMA, o que acabou ocorrendo apenas com a Instrução Normativa nº 6 de 15 de abril de 2015, entrando em vigor no dia 16. As novas normas receberam a denominação MAR-I, numa referência às "Máquinas Agrícolas e Rodoviárias" e à 1ª regulamentação das respectivas emissões.

À primeira vista, causa alguma estranheza o uso de kW (kilowatts) como unidade de potência, ao invés do CV (cavalo-vapor francês, equivalente ao PS alemão) amplamente usada no mercado brasileiro ou do HP (horsepower anglo-americano) bastante usado no segmento náutico e também em equipamentos estacionários, enquanto kW é mais usada em ex-colônias britânicas na África, Ásia e Oceania. A primeira fase da MAR-I já impunha limites aos níveis de ruídos para todos os equipamentos atingidos pela norma, bem como a adequação das emissões de poluentes em equipamentos de construção e movimentação de solo com potência superior a 37kW (50,3cv), enquanto para máquinas agrícolas a entrada em vigor se inicia em 2017 para potências iguais ou superiores a 75kW (102cv) e abrangendo todas as faixas de potência a partir de 2019. Há equivalência entre a nova norma brasileira e a EPA Tier III americana e a Euro III-A européia, e eventuais avanços deverão acompanhar o que vem ocorrendo naqueles mercados.

O controle de emissões faz algum sentido, principalmente com relação aos níveis de ruído que chegam a ser particularmente incômodos em regiões metropolitanas e outras áreas densamente povoadas, mas não seria apropriado desconsiderar o impacto financeiro provocado pelos upgrades necessários aos equipamentos para que se enquadrem nas novas normas, e eventualmente algumas particularidades de cada cenário operacional. Algumas medidas que seriam justas num equipamento de construção como uma motoniveladora (também conhecida em algumas regiões como "patrola"), podem não ser tão adequadas a um trator agrícola ou de manejo florestal. A emissão de óxidos de nitrogênio (NOx), que além de serem classificados como gases-estufa com maior intensidade de carbono que o CO² (dióxido de carbono) são apontados como um dos principais causadores da chuva ácida em áreas urbanas, pode até ser benéfica às lavouras ao se considerar a aptidão de alguns cultivares na fixação de nitrogênio atmosférico no solo, como é o caso do amendoim, da mamona e da mandioca (aipim/macaxeira).

A questão dos ruídos, por se refletir diretamente na saúde do operador, é muito bem-vinda, e o custo relativamente baixo de um silenciador (também conhecido no Rio Grande do Sul como "surdina") diminui eventuais resistências ao controle desse parâmetro, principalmente em tratores de movimentação industrial como os que são usados para o transporte interno de suprimentos entre os hospitais do complexo da Santa Casa de Misericórdia de Porto Alegre e unidades de apoio (lavanderia, nutrição e dietética, entre outras). Outros dispositivos com um custo mais elevado e necessidade de manutenção mais constante, como o EGR e o SCR já aplicados em alguns automóveis, caminhonetes, caminhões e ônibus para reduzir as emissões de óxidos de nitrogênio e o filtro DPF usado para limitar as emissões de material particulado (a fuligem em suspensão na fumaça preta visível, que ainda constitui um dos estereótipos mais associados ao Diesel), por sua vez, ainda provocam alguma resistência devido a eventuais aumentos no custo operacional e menor adaptabilidade ao uso de biodiesel ou mesmo de óleos vegetais naturais diretamente como combustível, uma pauta particularmente útil para atender ao setor agropecuário.

Outro aspecto relevante nas novas regulamentações é a classificação de alguns implementos especiais e o caminhão no qual estejam montados como um único conjunto autopropulsado. Tal fato acaba por levar a algumas dúvidas: mesmo que a superestrutura tenha um motor próprio para acionar o equipamento especial mas não auxilie na propulsão, e que este seja devidamente enquadrado na MAR-I, faria algum sentido que o motor do caminhão seguisse a mesma norma ao invés da Proconve P7, equivalente à Euro-V e atualmente em vigor para veículos automotores no mercado brasileiro. Entretanto, a possibilidade de um relaxamento na P7 para atender especificamente ao setor da construção civil é muito improvável de ser levada adiante.

Não é de se descartar que a MAR-I possa levar a especulações em torno de uma migração de operadores do ciclo Diesel para o ciclo Otto, que até hoje predomina nas empilhadeiras em função da possibilidade de usar combustíveis gasosos sem depender de uma injeção-piloto de algum combustível líquido para gerar centelha. Seria leviano negar que o menor custo de aquisição e a menor complexidade dos dispositivos de controle de emissões favorecem os motores de ignição por faísca. Certamente o etanol ou biogás seriam mais atraentes em zonas rurais por conta da facilidade em implementar uma produção local, eventualmente aproveitando rejeitos agrícolas, valendo-se também de uma maior estabilidade dos custos desses combustíveis em comparação ao gás liquefeito de petróleo (GLP, vulgo "gás de cozinha") que ainda é muito usado nas empilhadeiras.

A bem da verdade, causa alguma estranheza a não-inclusão na MAR-I dos motores utilizados para acionamento do compressor em caminhões e semi-reboques com câmara frigorífica, que ainda não seguem uma regulamentação específica no tocante às emissões. Até não deveria ser muito difícil ir um pouco mais além, e certificar os sistemas de refrigeração nas mesmas normas em vigor para veículos automotores ao invés da MAR-I, mas certamente as restrições ao Diesel em veículos leves pelas capacidades de carga, passageiros ou tração atualmente em vigor no mercado brasileiro levam a um desinteresse na busca de soluções para adequar os níveis de emissões de motores Diesel de baixa cilindrada e faixas de potência mais modestas aos rigorosos padrões aplicáveis ao mercado automotivo. Tomando um exemplo aleatório, não seria tecnicamente impossível usar um motor como o Fiat 1.3 Multijet em substituição aos Yanmar da série TNV atualmente empregados em alguns produtos das marcas Carrier e ThermoKing.

A implementação de normas de emissões para máquinas agrícolas e equipamentos de construção tende a suscitar polêmicas por afetar diretamente dois segmentos de grante importância para a economia brasileira. Há ainda muito o que se evoluir, e pode-se dizer que faltou um pouco de coerência e bom-senso ao se negligenciar algumas particularidades de cada cenário operacional abrangido pela MAR-I, mas não deixa de ser interessante a possibilidade de um controle de emissões mais rigoroso servir para mudar a percepção de motores Diesel como "sujos" que ainda é muito arraigada na "cultura" brasileira.

quinta-feira, 16 de abril de 2015

Motores 2-tempos de ignição por faísca: esclarecendo algumas dúvidas

Motores 2-tempos ainda são muito aclamados em alguns cenários operacionais pela simplicidade construtiva, relação peso/potência mais favorável e volume físico mais contido em comparação com um 4-tempos numa faixa de desempenho similar. Porém, um motor 2-tempos de ignição por faísca não é tão fácil de converter em um Diesel legítimo, de ignição por compressão, ao contrário do que ocorre num motor do ciclo Otto (4-tempos com ignição por faísca). Ainda assim, apesar da participação no mercado de veículos terrestres estar mais restrita a algumas motocicletas e equipamentos especiais como snowmobiles, tem ressurgido um interesse pelos motores 2-tempos de ignição por faísca devido a rumores quanto a uma eventual adaptabilidade ao uso de óleo diesel e respectivos substitutivos de origem renovável.

Para interessados numa conversão clandestina em um veículo leve para funcionar com óleo diesel, a hipótese de usar um motor 2-tempos de ignição por faísca se mostra particularmente convidativa por, teoricamente, não atrair uma atenção indesejada da parte da polícia ou das autoridades de trânsito. Apesar do ruído característico denotar que se trata de um motor "especial", a simples presença das velas de ignição já reduz consideravelmente o risco do operador ter o veículo apreendido e ser enquadrado por crime contra a economia popular, no entanto uma série de razões tornam tal plano muito mais difícil do que possa parecer inicialmente. A própria disponibilidade de motores 2-tempos de ignição por faísca em faixas de potência e torque adequadamente dimensionadas para aplicações automotivas já é muito limitada, e há ainda outros fatores que vão desde as próprias características do processo de combustão quanto ao controle de emissões de poluentes em localidades com uma inspeção veicular mais rigorosa.

Um possível empecilho à reintrodução dos motores 2-tempos de ignição por faísca em aplicações automotivas, e que também afeta os motores Diesel de um modo geral, é o controle das emissões de óxidos de nitrogênio. Pareceria simples usar o sistema EGR, que promove uma recirculação de parte dos gases de escapamento para que a presença de gases inertes de certo modo mantenha a temperatura do processo de combustão mais limitada, que tem predominado em motores de ignição por faísca e também amplamente usado em motores Diesel leves, porém o problema da carbonização que já é crítico ao atingir o coletor de admissão num motor 4-tempos de injeção direta (tanto Otto quanto Diesel) tomaria proporções caóticas no cárter e "janelas" de admissão dum 2-tempos com lubrificação por "perda total". A injeção suplementar de água com álcool no coletor de admissão, que num 4-tempos não só reduz as emissões de óxidos de nitrogênio mas também reduz a carbonização, prejudicaria a lubrificação num 2-tempos. Uma opção que resta, e tem sido predominante em aplicações rodoviárias pesadas (caminhões e ônibus), é o SCR, que promove a redução catalítica seletiva dos óxidos de nitrogênio por meio de uma reação entre os gases de escape e um fluido à base de uréia (32,5% de uréia industrial com 67,5% de água desmineralizada) disponível comercialmente com as nomenclaturas ARLA-32, ARNOx-32, AdBlue e DEF.

Em motores 2-tempos de ignição por faísca de concepção mais tradicional, ainda equipados com carburador, há operadores que de tempos em tempos usam querosene puro, sem adição do óleo, em pequenos percursos (ou num cavalete de manutenção) com o intuito de descarbonizar o motor por dentro. Pode parecer, à primeira vista, interessante usar óleo diesel convencional ou mesmo biodiesel devido à lubricidade mais intensa em comparação ao querosene, no entanto a volatilidade mais baixa não proporcionaria uma adequada vaporização. De qualquer maneira, tal procedimento não é possível num motor 2-tempos de ignição por faísca com injeção direta, visto que o óleo lubrificante ainda passa pela fase de transferência entre o cárter e os cilindros, junto ao ar da admissão, ao passo que o combustível é injetado separadamente já na câmara de combustão.

A injeção direta, um avanço que teve introdução relativamente recente nesse tipo de motor, de fato contribui para uma maior adaptabilidade aos combustíveis pesados, devido ao controle mais preciso do processo de combustão e principalmente à estratificação mais fina do combustível durante a injeção, e também contribui para um menor consumo de óleo lubrificante e carbonização menos intensa tanto ao redor dos eletrodos de vela quanto das "janelas" de escape e válvulas de potência (YPVS da Yamaha e similares - quando aplicáveis), mas o método de lubrificação mais comum ainda é por "perda total" do óleo durante a combustão. Atualmente a Evinrude já disponibiliza motores de popa com essa configuração para o Departamento de Defesa dos Estados Unidos, podendo operar tanto com gasolina quanto querosene (querosenes de aviação como o Jet A-1/JP-8 e outros de especificação estritamente militar como o JP-5 e até o "querosene iluminante") em caráter primário mas, ao contrário de alguns mitos que tem circulado amplamente, o uso de óleo diesel convencional deve ser mais limitado a casos de extrema necessidade quando não haja outro combustível à disposição.

Até não seria de todo impossível converter um motor 2-tempos de ignição por faísca para Diesel, mas um supercharger (compressor volumétrico de acionamento mecânico, também conhecido por "blower") se torna imprescindível para gerar pressão de admissão suficiente, tanto num motor com lubrificação por "perda total" quanto num com lubrificação por recirculação forçada do óleo. Considerando o crescimento no interesse pelo uso do gás natural como combustível para o transporte comercial em substituição ao óleo diesel que vem ocorrendo na Europa e nos Estados Unidos, e o uso do etanol em maquinário agrícola pelo setor sucroalcooleiro no Brasil, oferecem perspectivas mais adequadas aos motores 2-tempos de ignição por faísca, mas de fato ainda há precedentes para quem se disponha a fazer experiências com o óleo diesel e o amplo espectro de substitutivos de origem renovável economicamente viáveis.

segunda-feira, 13 de abril de 2015

Caso Ultracargo: convite a uma breve reflexão

No dia 2 de abril, um incêndio atingiu um depósito da empresa Ultracargo, em Santos, e persistiu até a última sexta-feira (10). Nos tanques, havia gasolina, mas numa simulação apresentada pela Rede Globo na edição de ontem do programa "Fantástico", por motivos de segurança foi utilizado ÓLEO DIESEL ao invés de gasolina. Além de todo o transtorno que já seria de se esperar em decorrência dum incêndio de grandes proporções, há de se considerar também o passivo ambiental. Vazamentos de gasolina chegaram a provocar uma alarmante mortandade de peixes no município de Cubatão, trazendo prejuízos à pesca artesanal que tem uma participação expressiva na economia local e prejudicando a disponibilidade de uma proteína animal mais facilmente acessível a algumas camadas mais pobres da população naquela região.

O que já seria um bom pretexto para reflexões quanto às vantagens do óleo diesel e dos principais substitutivos de origem renovável (tanto vegetais quanto animais) no tocante à segurança devido à menor volatilidade e pontos de fulgor mais elevados que dificultam a propagação de um eventual incêndio, também fomenta discursos a favor do biodiesel ao considerarmos a componente ambiental envolvida no referido episódio. Além do biodiesel apresentar uma toxicidade absolutamente desprezível em comparação à gasolina, a ponto de alguns adeptos desse combustível eventualmente beberem pequenas amostras, é biodegradável e pode até servir como substrato para o desenvolvimento de microalgas que acabam por servir de alimento para a fauna marinha, e portanto o impacto de um vazamento de biodiesel viria a ter menos efeitos adversos sobre ambientes naturais.

Num país com forte vocação agroindustrial, como é o caso do Brasil, chega a soar incoerente que tais características venham sendo solenemente ignoradas pela Agência Nacional de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) e pelo Ministério de Minas e Energia, o que acaba por levar a uma perpetuação das absurdas restrições impostas ao uso de motores Diesel em veículos automotores em função das capacidades de carga, passageiros e tração. A população fica mais exposta ao risco de catástrofes semelhantes ao incêndio em Santos, devido à incompetência de uma administração pública que elevou a corrupção ao patamar de uma endemia, e vale-se do infame monopólio da Petrobras como uma vaca leiteira para cobrir rombos nas contas públicas provocados pela irresponsabilidade fiscal.

segunda-feira, 6 de abril de 2015

Caso para reflexão: Diesel HPR da Propel Fuels

Há quem diga que os americanos são mais refratários ao Diesel, por razões tão diversas quanto uma eventual aversão ao odor dos gases de escape ou o fracasso do motor Oldsmobile 350 Diesel V8 (também conhecido como LF9), mas é dos Estados Unidos que vem algumas significativas evoluções em combustíveis alternativos. Uma delas é o Diesel HPR (High-Performance Renewable), produzido pela empresa californiana Propel Fuels, que também opera com etanol.

Embora tenha como principal matéria-prima óleos vegetais e gorduras animais, o Diesel HPR não é idêntico ao biodiesel que nós conhecemos. Ao invés de passar por uma transesterificação alcoólica, processo em que a glicerina separa-se enquanto um álcool (normalmente metanol ou etanol) se agrega ao óleo, o Diesel HPR é hidrocraqueado e refinado, e posteriormente aditivado para manter a lubricidade de acordo com as especificações ASTM D975. Vale destacar que o Diesel HPR já é vendido na Califórnia a preços competitivos, custando US$2,89 por galão contra a média de US$3,001 cobrada pelo óleo diesel convencional por lá, e num país com forte vocação agropastoril como o Brasil não seria difícil manter (ou até melhorar) essa vantagem.

Enquanto o biodiesel tem, de fato, um footprint ambiental menor que o do óleo diesel convencional, a emissão de óxidos de nitrogênio (NOx) persiste como calcanhar-de-Aquiles, e o blend conhecido como B20 (80% de óleo diesel convencional e 20% de biodiesel) resulta num acréscimo de 1,5% em comparação com o óleo diesel convencional puro, enquanto o Diesel HPR reduz em 14,3% as emissões de óxidos de nitrogênio. Tal redução se mostra particularmente benéfica ao considerarmos que acarretaria também num menor consumo da solução-padrão à base de uréia (AdBlue/DEF/ARLA-32/ARNOx-32) usada no sistema SCR (também conhecido como BlueTec quando aplicado a veículos Mercedes-Benz, Bharat-Benz, Mitsubishi Fuso, Freightliner e algumas versões da Dodge Ram) que vem sendo usado principalmente em veículos utilitários de médio e grande porte. De modo geral, o decréscimo nas emissões de gases-estufa, medida por "equivalência em carbono", atinge uma média de 67% em comparação ao óleo diesel convencional, enquanto com o blend B20 fica limitada a 13,7%.

A redução nas emissões de material particulado (a fuligem presente na fumaça preta usualmente apontada como um dos maiores inconvenientes dos motores Diesel) atinge assombrosos 34,2% e portanto é de se esperar uma saturação menos intensa do filtro de material particulado, mais conhecido como DPF. O índice de cetano (valor que mensura a velocidade de propagação da chama na câmara de combustão) é 75, superior ao mínimo de 40 exigido pelas especificações ASTM D975 em 87,5%. O ponto de fulgor, mesmo sendo 8º C mais elevado que no óleo diesel convencional (60º C contra 52º C), aparentemente não deve ser suficiente para causar dificuldades à vaporização do combustível durante o processo de "regeneração" do DPF.

Lamentavelmente, o mercado brasileiro enfrenta algumas barreiras que desencorajam a introdução de combustíveis com especificações similares, não apenas pelas absurdas restrições ao uso de motores Diesel em função da capacidade de carga, passageiros ou tração nos veículos leves mas também pelo cenário regulatório esdrúxulo promovido pela ANP (Agência Nacional de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis), que acaba por proporcionar uma perpetuação do monopólio da Petrobras e mantém o povo refém da incompetência de uma administração que tem levado a corrupção a níveis cada vez mais ultrajantes.

sexta-feira, 3 de abril de 2015

Mais uma pérola do YouTube: motor Ruston WB de válvulas laterais


Motores de válvulas laterais (no bloco) com ignição por faísca foram até bastante comuns até a década de '50, favorecidos por um custo de fabricação menor em comparação a motores com válvulas no cabeçote, tendo entre os exemplos mais notáveis o V8 Ford "flathead" introduzido originalmente em 1932 e que ganhou sobrevida no Brasil até 1966 equipando o Simca Chambord, versão local do antigo Ford/Simca Vedette francês. Se por um lado a disposição de válvulas laterais se mostra adequada a faixas de rotação mais contidas, por outro as limitações referentes aos fluxos de admissão e escape e as taxas de compressão mais modestas não pareciam tão adequadas às características operacionais de motores do ciclo Diesel. Uma intrigante exceção é o motor Ruston-Hornsby 1WB, produzido entre 1963 e 1968 na Inglaterra.

Tinha uma característica bastante peculiar para auxiliar na partida, que era uma injeção suplementar de óleo para aumentar momentaneamente a taxa de compressão. É um motor bastante rústico, de 1 cilindro vertical e refrigeração a ar, e desenvolvendo apenas 5,5hp a 3000RPM era mais apropriado a aplicações estacionárias e eventualmente podia até servir a um microtrator, e se por um lado não seria prático para uso automotivo (nem mesmo num Fusca ou num Citroën 2CV) por outro serviria como prova-de-conceito da viabilidade técnica do uso de válvulas laterais num motor Diesel. Cabe destacar que atualmente se observa uma crescente evolução nos sistemas de gerenciamento e injeção eletrônica para motores Diesel, que passam a poder operar com taxas de compressão mais baixas, e há ainda o uso do infame EGR que usa uma parte dos gases de escape para restringir o fluxo de admissão, ambas as medidas com o intuito de controlar as emissões de óxidos de nitrogênio (NOx), então de certo modo pode-se dizer que as principais restrições ao uso de válvulas laterais em motores Diesel estão sendo derrubadas.

Mesmo que o mercado automobilístico não venha a se mostrar tão receptivo a uma reintrodução de motores de válvulas laterais, as vantagens no tocante ao peso e volume físico em comparação a motores com válvulas no cabeçote podem até ter algum apelo em aplicações náuticas comerciais (em embarcações de pesca artesanal, por exemplo) e agrícolas, além da menor quantidade de partes móveis ser particularmente atrativa por ter menos pontos propensos a falhas ao operar em condições ambientais mais severas.